Gordo de Raiz

Gordices em Campos do Jordão

Crônica originalmente publicada em 9 de julho de 2011 no Papo de Gordo.

Depois de cometer o pecado de passear em novas cidades e não experimentar a culinária local, compensei de forma impecável no último feriadão, quando visitei Campos do Jordão e comi que nem um condenado à morte por inanição diante de uma mesa farta magicamente reposta de forma eterna.

OK… Até eu me assustei com a bizarrice da metáfora.

Tudo começou quando minha esposa miraculosamente conseguiu um hotel em Campos do Jordão. Para quem não conhece, a simpática cidadezinha paulista é tão procurada no período de inverno que hotéis e pousadas ficam com todas as reservas lotadas para o período ainda no verão. Ter ocorrido uma desistência pouco antes de ligarmos, sem esperança, para achar uma hospedagem era um sinal divino de que eu precisava conhecer a cidade.

O início não foi muito animador, pois pegamos um engarrafamento monstruoso na única estrada que leva à cidade. Era uma infinidade de carros dos mais diversos modelos, sendo a maioria beeeeem caro. Atrás de mim, por exemplo, estava um carinha que, de vinte em vinte minutos, abria e fechava a capota de seu conversível, deixando a loura que estava a seu lado sorrindo e vibrando.

O engarrafamento foi um bom indicativo de que a cidade estaria lotada. E estava. Ainda assim, era possível encontrar vaga para estacionar nas ruas um pouquinho mais distantes do centro. A caminhada, contudo, valia a pena: Nunca vi uma concentração tão grande de restaurantes, lanchonetes e congêneres numa área tão pequena. Havia opções variadas de comilança para todo lado que se olhava!

Mesmo com tanta opção, em alguns casos era necessário esperar algum tempo para ser atendido. Isso me permitiu observar os trocentos grupos de turistas que andavam de um lado para o outro. Pude constatar cinco “tipos” principais de turistas, sendo que a maioria dos visitantes era formada pelo que chamei, didaticamente, de “piriguetes foguentas”: grupos de cinco a oito meninas jovens com minissaias muito pequenas para o frio que estava fazendo. Claro que não era todas piriguetes no sentido clássico do termo, mas apenas do ponto de vista empírico (é tão bom usar termos científicos de forma irresponsável…).

Os outros grupos eram, em ordem, “famílias com filhos” (nem precisa explicar, né?), “fãs não-cronológicos do Restart” (uns caras de cerca de 30 anos com cabelinho arrepiado e roupas que já seriam bizarras em adolescentes, mas que ficavam especialmente escrotas em homens mais velhos), “casais apaixonados” (grupos em múltiplos de dois, onde os homens tentavam impressionar as namoradas ao bancar restaurantes caros e as mulheres beliscavam seus amores quando eles olhavam para as “piriguetes foguentas”) e, por fim, o clássico “outros”.

Uma outra coisa que ocorre muito em Campos do Jordão nesse período em que está cheio de gente com bastante dinheiro no bolso é a infinidade de marcas fazendo propaganda em tudo quanto é canto, contratando promoters bem bonitas para distribuir folhetos e brindes. Se bem que também vi um grupo de anões fantasiados de Kiss, mas não consegui entender o que exatamente eles estavam divulgando.

Agora, vou parar de enrolar e partir para o que realmente interessa: Comida! Eu imaginava que Curitiba era a cidade brasileira mais bem servida de comilança no Brasil, mas Campos do Jordão pode ser considerada praticamente empatada com a capital paranaense (proporcionalmente, já que a cidade é menor).

Minha saga começou na Osteria Peretti, onde devorei um nhoque ao molho bechamel (e quase metade da massa sei-lá-qual-nome que minha esposa pediu). A sobremesa foi no Campos Gelato Sorvete, lá pertinho, onde havia dezenas de sabores bizarros (incluindo sorvete de Johnnnie Walker e alguma coisa azul com estrelinhas). No mesmo ambiente, havia a Bruno Alves Chocolate, onde minha esposa comeu uma espetinho de morangos coberto com um maravilhoso chocolate derretido.

Como ainda estava com a gula à toda, desci a rua e dei de cara com o Pastelão do Maluf, lanchonete de um fã do político que, pelo visto, tem pelo menos uma coisa boa ligada a seu nome. Comi feliz da vida o pastel de 30cm recheado com uma quantidade indecente de carne, ovos e queijo. Não é o melhor pastel do mundo, mas empanturra bem e equivale a um almoço. Exatamente por isso, fiquei só com espaço para um waffle com sorvete de chocolate na Cremeria Nestlé, que estava numa área montada especialmente para esse período de férias.

Por fim, depois de esperar algumas horas para nos recuperarmos, fomos jantar no restaurante Só Queijo. Eu estava de olho no fondue, mas preferimos deixar para o último dia e comemos umas carnes muito boas, mas das quais não lembro o nome.

No segundo dia, depois de dormir quase a manhã inteira para poder digerir num estilo jiboia toda a maçaroca de comidas variadas do dia anterior, partimos para um almoço leve no Barito. Comecei com uma entrada de bruschettas e uma limonada suíça feita com leite condensado. Depois, parti para um crepe de quatro queijos gigante e, pra fechar, a melhor coisa que comi em Campos do Jordão: Um fondue de churros!

Quem ouviu o podcast sobre a vida universitária sabe o quanto sou viciado em churros. Fazia tempo que eu não saboreava com tanto prazer um prato. Só não repeti porque ainda precisava fechar o dia jantando no QG da Pizza, uma pizzaria temática da Segunda Guerra Mundial, onde comi uma pizza de massa grossa (como as verdadeiras pizzas devem ser) meio Folgore (quatro queijos), meio Panzer (picanha!).

No terceiro dia, por descargo de consciência, fizemos um pouco de “turismo tradicional”. Visitamos o Morro de Elefante (sem piadinhas, por favor) e o Horto Municipal. Lugares muito legais, embora o horto certamente fique mais bonito na primavera. Para compensar as calorias perdidas com as caminhadas, escolhi o restaurante La Gália para almoçar, de olho no famoso Javali à Obelix! Pena que não fui muito feliz na escolha. Apesar de gostoso, o prato não fazia jus ao gordinho gaulês, já que era um simples pernil com um pouco de arroz e legumes. Com a fome que eu estava, pensei que comeria um javali inteiro!

Em compensação, a janta fechou o passeio a Campos do Jordão com chave de ouro. Voltamos ao Só Queijo e caí matando nos fondues de queijo e de carne. Uma mesa muitíssimo bem servida para mim e para minha esposa (que, para minha imensa felicidade, já estava com a barriga um tanto cheia e deixou uma boa parcela de fondue para eu devorar sozinho). Tudo bem que volta e meia eu perdia o pão no meio de queijo derretido ou a carne escapulia na hora de tirar do óleo, mas nenhum fondue é completo sem alguém totalmente inapto tentando comer igual gente.

Fica minha dica para todos os turistas gastronômicos que leem minhas opiniões altamente parciais e subjetivas: A melhor forma de aproveitar Campos do Jordão é comendo de forma absurda e inconsequente! Pena que, no último dia, resolvemos sair cedinho para fugir do engarrafamento e só deu tempo para pegar algumas canequinhas de fondue de chocolate que um cartão de crédito estava dando de brinde (sugiro a todo mundo a experiência de beber fondue direto na caneca – a garganta fica arranhando e a língua queima, mas é bem legal).

É claro que todo mundo teve a mesma ideia e levei horas até chegar na Dutra. Antes eu tivesse ido comer mais um pouco de fondue de churros com um pastelão de sobremesa. Afinal, sempre é bom fazer um lanchinho básico antes de pegar a estrada…

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* Uma pequena atualização: Não se anime muito com o fondue de churros que eu citei no texto porque eu voltei a Campos do Jordão alguns anos depois e o restaurante foi vendido e, apesar de constar (meio escondido) no cardápio do novo restaurante, ele não merece nem 1% dos elogios que eu fiz (se o texto fosse escrito nessa nova visita, eu nem o citaria na crônica, pra ser sincero). Mantive o texto intacto, contudo, porque não quero ficar triste sozinho.

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